quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Entrevistas

Usando o gênero “Entrevista” o blog conversou um pouco sobre o tema “Pluralidade Cultural” com duas alunas do curso de Letras da UNIP- Sorocaba.
Mirela tem 19 anos. Nasceu no Japão e é filha de uma brasileira e seu pai é japonês. Cresceu no Japão sendo alfabetizada muito cedo em japonês e aos 7 anos de idade em português.
BLOG: Como foi o relacionamento com os outros alunos da sua sala aos 8 anos quando sua família veio morar no Brasil?
Mirela: A primeira recepção foi ótima, era uma novidade ter uma aluna estrangeira na escola. Os outros alunos me faziam muitas perguntas sobre o Japão como por exemplo se tinha neve, como era brincar nela e se era legal morar lá. Eu gostava de respondê-los mas com o tempo, começaram a perceber que eu falava com sotaque, trocava palavras, misturava português com japonês, riam muito e eu me sentia muito chateada.
BLOG: Quais foram as conseqüências das brincadeiras e risadas que os alunos faziam contra você?
Mirela: Comecei a não falar mais o japonês, nem em minha casa. Comecei a falar apenas o português com o sotaque sorocabano, com o tempo esqueci totalmente o japonês.
BLOG: Aos 11 anos você retornou ao Japão. Como foi sua volta para a escola?
Mirela: Quando retornei meu avô me matriculou em uma escola brasileira que tinha aulas de japonês e com o tempo relembrei a língua japonesa.
BLOG: Quando voltou para a escola japonesa assim que relembrou o japonês, como foi a convivência com os alunos japoneses?
Mirela: Foi a mesma recepção que tive aos 8 anos no Brasil. Me perguntavam muito sobre o futebol, carnaval e café. Com o tempo, ao contrário dos brasileiros, não riam de mim e do meu sotaque, mas acabaram me excluindo e ignorando.
BLOG: Qual a lição que você leva hoje dessa diversidade cultural que você viveu nos dois países?
Mirela: Aprendi a importância de respeitar as diferenças culturais.

Daniele Cesaria da Silva Penteado, casada, mãe de três filhos, pedagoga há nove anos formada  na Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERL e Pós graduada pela Universidade Cândido Mendes.
BLOG: Como começou sua docência?
Daniele: No Rio de Janeiro só com estágios. Fui alfabetizadora de jovens e adultos por um ano em um programa que alfabetiza servidores analfabetos, este era remunerado, ja os obrigatórios foram em escola pública e particular.
BLOG: quanto tempo ficou nesse programa?
Daniele: Por um ano, peguei a turma em março e fui até dezembro. Formei-me em dezembro de 2002 e este estagio foi em 2001. Não continuei em 2002 porque teria que conciliar estagio obrigatório, com monografia, uma filha de um ano e uma nascendo no final do ano. Achei que não ia conseguir me comprometer o suficiente com eles. Em 2003 fiz pós, comecei em janeiro de 2003 e terminei em janeiro de 2004, em fevereiro fui para Belo Horizonte.
BLOG: Demorou quanto tempo para atuar na área?
Daniele: Em BH três anos.
BLOG: Demorou esse tempo porque você não foi atrás ou porque não conseguia vagas? Chegou trabalhar como eventual nesse período?
Daniele: Porque não conseguia vagas, estive efetivamente perto de ser empregada duas vezes apenas até conseguir o primeiro. Trabalhei como eventual no mesmo ano que consegui o primeiro emprego porque não conhecia bem a área pública em BH,mas minha experiência em eventual de BH não conta em nada no Estado de São Paulo
BLOG: Quais foram as dificuldades encontradas nesse tempo de procura?
Daniele: A meu ver a primeira era a falta de experiência, pelo menos ouvi bastante isso, seu currículo e muito bom você tem duas pós, mas infelizmente não tem experiência, em segundo meu sotaque. Eu vim do rio de janeiro e como nasci, fui alfabetizada lá, e vivi lá, sendo assim minha fala tinha traços característicos como, por exemplo, o famoso "chiado” nas palavras que possuem S no meio ou no fim o carioca pronuncia com som de X.
BLOG: E quando você conseguiu sua primeira turma foi em BH mesmo? Quais eram a reação e comentários das crianças quanto ao sotaque?
Daniele: Bom infelizmente quando tive a primeira turma, já me policiava bastante para não "chiar", pois naquelas duas mais efetivas possibilidades de emprego que mencionei em uma a desculpa foi falta de experiência a outra disse que era por causa do meu "chiado", como não sabia se a segunda era preconceituosa ou se as duas eram e somente a última foi verdadeira o suficiente resolve me policiar, quando “chiava” repetia a palavra de maneira correta, mas mesmo assim em algumas palavras e até mesmo pela melodia da fala, se é que se pode falar assim as crianças percebiam.
Então no início algumas me perguntavam “tia você é baiana ou carioca?”, “tia você fala diferente é engraçado”, mas era de uma maneira bem franca. Uma vez um aluno meu que chegou na segunda feira todo eufórico e me disse: “Tia Dani você não sabe o que aconteceu, eu conheci um amigo do meu pai que foi lá em casa tinha que ver ele fala igualzinho você!”
BLOG: Quanto tempo ficou morando em BH?
Daniele: Cinco anos.
BLOG: Com esse seu policiamento no seu sotaque, você acha que foi perdendo-o ou perdendo parte de sua identidade
Daniele: É esquisito, eu acabei tendo um pouquinho das duas coisas porque ao estar em sala de aula eu percebia que para uma criança nascida em BH iniciando seu aprendizado era confuso escrever s falar x, então de alguma forma vi a necessidade de ter cuidado,  fui forçando a falar diferente, em compensação quando eu ia ao Rio eu ouvia assim dos meus primos, amigos e tios: “Dani você está louca! Agora vai ficar imitando mineiro é? Eu hein é coisax, coxtas, se ficar falando com essa frescura nós vamos por pimenta na sua boca!”, claro que era brincadeira mas eu sentia que tava perdendo um pouco minha identidade.
BLOG: E quando você veio com a essa bagagem de cultura carioca e mineira morar entre os paulistas, principalmente os de Sorocaba que tem um sotaque mais digamos... acentuado. Como foi a experiência nas escolas daqui?
Daniele: Bem diferente porque não percebi preconceito dos adultos, muitos brincam, comentam, perguntam de onde que eu sou afinal fiquei com um sotaque indefinido. Das crianças as mesmas reações dos meus alunos de BH, umas achavam engraçado, outras tinham duvidas se eu era carioca ou mineira, mas sempre sabiam que eu não era daqui pois eu não falo “leitE” e sim “leitI” e não falo o “R” do interior.
BLOG: Como professora o acha dessa mistura de culturas em sala de aula entre os alunos?
Daniele: Vejo de uma maneira boa, hoje sou mais experiente, sei que eu ensino meus alunos de maneira correta, sei que jamais escreverei na lousa “Leiti ou penti”e quando pergunto me sinto tranquila em responder que minha maneira de falar é diferente porque sou de uma região diferente.
BLOG: Você já recebeu alunos novos transferidos de outro estado? Se sim como foi a recepção entre os demais?
Daniele: Este ano uma aluna entrou em Agosto, ela veio da Bahia, meus alunos são de 4ª série e são alunos de um lugar onde os pais são pessoas simples com pouca escolaridade, então tivemos conversas, perguntamos como era lá na Bahia, falei para eles como era BH e Rio. Rimos de algumas diferenças de palavras, mas claro nem tudo são flores.
Teve aluno que tentava imitar quando ela acabava de falar ele repetia então comecei a repetir todas as vezes que eles falavam frases com palavras inadequadas. Tenho uma relação boa com meus alunos e se eu imito, ele reclama então digo: “engraçado quando você imita a Andressa você acha tão legal... pensei que você gostasse.”
BLOG: O que você acha da pluralidade cultural, em especial, no dia a dia de um aluno?
Daniele: Hoje consigo entender e compreender a dificuldade de ser diferente, estudar Letras me ajudou muito claro, mas a sala de aula me amadureceu como professora percebo que em sala de aula, pelo menos pra mim, é obrigatório explorar as diferenças. Infelizmente vivemos em uma sociedade em que a escola assumiu papéis que antes não lhe cabiam, como por exemplo a educação. Antigamente as mães os pais estavam mais presentes na educação dos filhos e a escola podia ter o seu papel de escolarizar porque a educação vinha de casa, hoje a educação vem da TV, da internet, da novela, da comunidade, da escola e acabo me sentindo obrigada a passar valores como por exemplo o respeito.
São em pequenos exemplos que acredito que eles possam fortalecer o respeito e a tolerância  e se hoje eu faço um aluno esperar sua vez pra falar, quando eu obrigo eles ao invés de somente pedir desculpas por uma ofensa pensar o porquê fez aquilo, depois me responder a pergunta: “E daí qual diferença? Ela é gorda você é magro, ela tem um cabelo duro você não e daí? Vocês estão aqui dentro do mesmo espaço aprendendo a mesmo coisa.”
Parecem coisas bobas, mas eu estou com eles pequenos ainda, talvez isto ajude talvez não, mas o respeito por uma colega que seja gorda ou que fale diferente, hoje pode evitar preconceitos mais sérios mais tarde como opção sexual, religião e tantos outros que vemos por aí.

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